Dos anos de Formação à Conquista do
Poder
Autor: Lira Neto
Editora: Companhia das Letras
Assunto: Biografias - Política
Edição: 1ª
Ano: 2012
Páginas: 624
Comentários de Nivaldo Cordeiro: A Companhia das Letras fez chegar ao mercado o
primeiro volume da biografia de Getúlio Vargas (Getúlio – 1882-1930: Dos anos
de formação à conquista do poder), de Lira Neto, prevista para ser uma
trilogia. Um grande feito editorial, narrado em detalhes no posfácio (que bem
poderia ser um prefácio) do próprio autor. A editora apostou no projeto,
financiou-o e pôs à disposição do autor os meios para realizar sua obra. O fato
é inusual no nosso acanhado mercado editorial, no qual geralmente os editores
são medrosos e argentários, fugindo do risco.
Não bastante, a editora precificou o volume em apenas
R$ 52,50, um grosso volume bem encadernado, em excelente papel. Segundo a
revista Veja a tiragem inicial foi de trinta mil exemplares, muito acima da
média nacional. O livro é tão bom, o preço tão acessível e o personagem tão
fascinante que deverá ser esgotada rapidamente. Se o autor está de parabéns
pela iniciativa, mais ainda está o editor Luiz Schwartz. Que outros sigam o
exemplo.
Lira Neto é já um consagrado escritor, autor da
biografia de José de Alencar e da melhor feita sobre o Padre Cícero, seu
trabalho anterior, que virou best seller.
Ele é um pesquisador exaustivo e também um escritor talentoso. Sua narrativa
lembra, em muito, aquela utilizada por Fernando Moraes ao escrever o já
clássico Chatô - O rei do Brasil. Sem perder nunca o fio ele narra a vida do
biografado intercalando diferentes momentos e diferentes episódios, criando um
efeito parecido com aquele encontrado nos melhores livros policiais. O suspense
é integral.
Mesmo se conhecendo a vida de Getúlio Vargas, a
técnica narrativa prende o leitor de forma magnética. Eu simplesmente fui
largando tudo que lia para poder dar cabo à leitura do excelente livro do Lira
Neto. Um grande prazer e um suplemento adicionais de informações, não apenas
biográficas, mas da política brasileira no período abordado. O painel feito é
uma perfeição, acrescentando informações importantes sobre o que aconteceu
naqueles momentos fatídicos do início do século XX, quando os destinos do
Brasil foram moldados. Para o bem e para o mal, Getúlio Vargas tornou-se o
principal responsável pela formação política que herdamos.
A chamada República Velha foi o período de transição
entre o Império e os tempos contemporâneos. O Brasil era, de fato, uma
federação e o poder central estava longe de ser o que é hoje, uma força
esmagadora de um Estado central. As liberdades eram maiores, tanto para as
unidades políticas subalternas como para as pessoas. Desde Vargas entrou-se em
um ciclo de concentração de poderes ao
qual estamos agora submetidos. Não seria mais possível, depois de Vargas, haver
uma "revolução" por cima, a partir de um dos estados federados. A
desproporção de forças é tamanha que algo como se viu em 1964 só é possível a
partir da própria unidade central.
Getúlio foi um personagem fáustico, personificando o
pacto que nosso país realizou. Sua própria morte trágica é sinal hiperbólico
desse pacto. Não ao acaso o mantra do desenvolvimento - o desenvolvimentismo -
deriva diretamente da intervenção getulista em nossa história. O
desenvolvimentismo é a ideologia desse pacto, abraçada por todas as forças
políticas desde então, fazendo do poder de Estado a alavanca motora. Getúlio
chegou ao Rio de Janeiro para subir no promontório e ver sua obra fáustica se
realizar, algo como narrado esplendidamente por Goethe em seu poema monumental.
O escritor que melhor retratou essa mudança na
República Velha foi Guimarães Rosa. Grande Sertão, Veredas, Sagarana e Corpo de
Baile são ambientados nessa época. Ler a obra do escritor mineiro em conjunto
com a biografia de Getúlio, por Lira Neto, é altamente esclarecedor das
metamorfoses por que passou o Brasil, em consonância com aquelas vividas por
todo o Ocidente.
Lira Neto, assim, ajuda-nos a compreender a nossa
própria formação como Nação e esclarece pontos obscuros desse processo. Não
fosse por outra razão, esta já seria suficiente para tornar seu belo livro um
clássico, de leitura obrigatória por aqueles interessados em entender o Brasil.
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