"Sou um só, mas ainda assim sou um. Não posso fazer tudo, mas posso fazer alguma coisa. E, por não poder fazer tudo, não me recusarei a fazer o pouco que posso"

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

ADMIRÁVEL MUNDO NOVO

Original: Brave New WorldAutor: Huxley, Aldous Leonard.
Assunto: Romance (distópico)
Editora: Globo
Edição: 2ª
Ano: 2001
Páginas: 310

Nota: Admirável Mundo Novo não é uma obra de ficção distópica, mas um relato do programa de eugenia mundial. Fato denunciado pelo próprio autor antes de sua morte.
Admirável Mundo Novo é o retrato sombrio e profético da tirania com face humana. Escrito em 1931 e publicado em 1932, este livro é uma antevisão de um futuro no qual o domínio quase integral das técnicas e do saber científico produz uma sociedade totalitária e desumanizada. Esta ficção científica surpreende pela clareza do texto, pela lucidez de Huxley e pela atualidade das questões levantadas.

Narra um hipotético futuro onde as pessoas são pré-condicionadas biologicamente e condicionadas psicologicamente a viverem em harmonia com as leis e regras sociais, dentro de uma sociedade organizada por castas. A sociedade desse "futuro" criado por Huxley não possui a ética religiosa e valores morais que regem a sociedade atual. As crianças têm educação sexual desde os mais tenros anos da vida. O conceito de família também não existe.

A maior parte da trama passa-se em Londres, seiscentos anos no futuro (632 d.F). O mundo foi dominado pelos controladores mundiais, cujo objetivo é assegurar a estabilidade e felicidade sociais, tal qual a apologia das esquerdas nos tempos atuais. Por causa disso, o conceito estruturador do regime é o utilitarismo, ou a maximização da felicidade geral da sociedade. O romance começa no Centro de Incubação e Condicionamento de Londres Central, um centro de produção de seres humanos, cuja quantidade é mantida num patamar “ideal”.

O livro retrata a sociedade imaginada por Huxley, onde “todos pertencem a todos”, num esforço para erradicar o individualismo. Todos são felizes e perfeitos... A Sociedade "perfeita" é mostrada por Huxley através da história de uma jovem típica, pertencente a uma das castas altas, que, em uma crise existencial, conhece uma reserva de selvagens e particularmente um selvagem (a reserva é uma alegoria para o mundo real). As duas personagens representam o antagonismo entre a nova e a velha sociedade, os novos e os velhos padrões. Ela vive em uma sociedade formada por pessoas pré-programadas genética e psicologicamente para desempenhar um papel social e gostar deste, sem questionar ou desejar, nem mais nem menos, simplesmente ser o que lhe foi designado pelo Estado, mantenedor do Bem-estar geral. O selvagem, por outro lado, vive em um mundo cheio dos antigos valores e costumes, dogmas e tradições.

É uma forma de criticar a substituição das pessoas por máquinas, de uma forma diferente: substituindo o lado humano, os sentimentos e emoções, por sensações pré-programadas. Os seres humanos são produzidos em linhas de montagem como os produtos genéricos e condicionados a aceitar uma série de dogmas sociais, são padronizados e, no entanto continuam presos a dogmas, embora estes mudem de uma sociedade para outra, sendo atribuídos de formas diferentes: por um lado, através da educação infantil e, por outro lado, através do condicionamento hipnopédico (em outras palavras, adestramento).

As crianças são criadas em centros de condicionamento do Estado. A figura de pai e mãe é completamente abolida. O lar é descrito como um local doentio, mal cheiroso e palco de intimidades e emoções. Os dominadores substituíram a cultura com campanhas contra o passado, destruição de monumentos e livros e banindo a reprodução sexual. A religião, particularmente o cristianismo, foi transformada em um culto a Henry Ford. Para enfatizar a produção em massa, todas as cruzes foram cortadas para a forma de “T”. Além disso, havia sido inventada uma nova droga chamada soma, com os mesmos efeitos da cocaína e heroína, mas sem efeitos colaterais. O soma garante que as pessoas passem mais tempo alucinando do que pensando e, por causa disso, é distribuído gratuitamente pelo governo.

Impossível não ver no Estado descrito em "Admirável Mundo Novo" o Estado totalitário, socialista ou comunista, ambos ditatoriais e avessos a qualquer outra possibilidade para a sociedade.

Setenta e oito anos depois que o livro foi escrito como criticar o Admirável Mundo Novo quanto à sua utilização do soma quando não estamos muito longe disso, ao utilizar Prozac? Criticar a sua alienação quando nos deixamos imbecilizar pela televisão, cinema, vídeo, músicas e revistas das quais nos lembraremos por apenas uma estação? A sociedade atual não é tão consumista e manipuladora quanto a descrita por Huxley no início do século passado? Não somos também nós, como os seus personagens fictícios, crianças grandes, brincando com brinquedos cada vez mais caros e sofisticados? Crianças que fogem dos problemas, lêem revistas e assistem programas que nos dizem o que vestir, o que comprar e como agir? As gerações atuais já não conhecem os efeitos hipnopédicos da TV e do rádio?

Muitos já tomam soma (o que é o soma senão o ópio do povo, os estádios de futebol, as danceterias, os shows alucinógenos, os filmes de péssima qualidade e, por que não dizer, a maconha e a cocaína?).

No entanto, é sempre bom ressaltar também o outro lado: aquilo que ainda temos de mais precioso, algo que as pessoas do "Novo Mundo" já perderam: humanidade, espiritualidade e liberdade. No mundo utópico apresentado pelos esquerdistas totalitaristas, aqueles que ousam pensar são alvos de preconceitos e perseguições. No mundo real, as coisas já não são bem assim: aqueles que pensam diferente são até recompensadas. O pensar é incentivado, ao menos em ALGUMA parcela da população, enquanto que no "Novo Mundo", ele é cortado antes mesmo de a criança nascer. No "Novo Mundo", cada pessoa é especializada como uma formiga, vivendo unicamente para exercer a profissão a que foi destinada antes de nascer e tendo sido condicionada para gostar disso. Sem dúvida, isso resolve o problema do desemprego. Mas a que preço? O preço da liberdade de escolha, da liberdade de querer ser alguém, de querer crescer na vida. A vida individual, uma das coisas mais valiosas que o homem conquistou com o seu desenvolvimento evolutivo, é anulada pela vida coletiva; perde o sentido. As pessoas deixam de ser seres humanos e passam a ser máquinas superespecializadas para exercer uma determinada atividade. Isso as torna tão dependentes dos outros que elas deixam de existir sem alguém por perto. Daí vem a ansiedade por locais "cheios de gente" de todos. Eles sentem-se seguros, protegidos, o seu instinto não foi anulado, continua ali, dando seus sinais, ainda que, de certa forma, alterado.

Por fim, mas não menos importante, é preciso ressaltar mais uma grande mensagem de Aldous Huxley: o Homem ainda faz parte da Natureza. Ele não pode anulá-la, pois ela vive dentro dele próprio. Ele ainda pode voltar a ser o que era antes de se "destacar" de seus "irmãos", se é que chegou a ser.

No Brasil, onde o Estado já está divinizado com o beneplácito da CNBB marxista, a única coisa que ainda não foi destruída pela esquerda psicopata, foi a reprodução sexual.


PREFÁCIO DE OLAVO DE CARVALHO


Se houve no século XX um escritor que nunca cedeu ao cansaço e ao tédio, que conservou até o fim um apaixonado interesse pela vida e pelo conhecimento, que não cessou de se elevar a patamares cada vez mais altos de compreensão, até chegar, em seus últimos dias, às portas de uma autêntica sabedoria espiritual, esse foi Aldous Huxley.

 
Como artista, é cheio de imperfeições. Nenhuma de suas obras dá a medida integral da riqueza da sua personalidade ou da solidez de seus recursos intelectuais. Ao contrário, cada uma delas, se tem o brilho de um achado literário premiado por um êxito retumbante, desperta em seguida a suspeita de ter sido apenas um golpe de sorte. Por isto Huxley, amado pelo público, foi com freqüência visto com certo desdém pelos críticos eruditos (o nosso Otto Maria Carpeaux, por exemplo). Mas a crítica erudita julga livros e não almas. O homem Aldous Huxley, visto na perspectiva integral de sua vida e de suas obras, é bem melhor do que a crítica deste ou daquele livro em particular pode revelar. Nessa escala, o público o enxergou melhor que os críticos. Poucos homens de letras souberam honrar tão bem, pela seriedade de sua luta pelo conhecimento, o amor que o público lhes devotou.

 

Símbolo e resumo de sua trajetória vital é a luta de décadas que ele empreendeu contra a cegueira. A doença que aos 17 anos reduziu sua visão a aproximadamente um décimo do normal não foi para ele, como provavelmente o seria para muitos outros escritores numa era de egocentrismo e auto piedade, ocasião de especulações vãs sobre a maldade do destino. Foi a oportunidade de um mergulho nas fontes corporais e espirituais da percepção, mergulho que acabou por fazer dele o autor de reflexões epistemológicas bem mais interessantes do que muitas obras de filósofos acadêmicos sobre o assunto. Algumas dessas reflexões surgiram ao longo de sua experiência com os exercícios do Dr. Bates, um despretensioso oftalmologista norte-americano cujo sucesso na cura de Huxley veio a tornar célebre. O Dr. Bates era um inimigo dos óculos. Achava que todo olho doente tem momentos de sanidade que são estrangulados pela camisa-de-força de uma lente de grau fixo. Muito de sua técnica consistia apenas em restaurar no paciente a curiosidade visual e o amor à luz. Talvez ele nunca tenha atinado com a formidável importância filosófica de sua técnica. Mas Huxley, à medida que recuperava a visão graças aos exercícios de Bates, ia fazendo duas descobertas filosóficas fundamentais. A primeira delas estava sendo elaborada simultaneamente, sem que Huxley o soubesse, pelo filósofo basco Xavier Zubiri, uma das mais poderosas mentes filosóficas deste e de muitos séculos. Segundo Zubiri, não existe aquela coisa kantiana de dados sensíveis brutos, caóticos, colhidos pelo corpo e sintetizados na mente segundo padrões a priori. A percepção humana é, inerentemente, percepção intelectiva ou, na fórmula zubiriana, “inteligência senciente”. Isto tapava, de um só golpe, o abismo que três séculos de idealismo filosófico haviam cavado entre conhecimento e realidade. “Realidade”, diz Zubiri, é o aspecto formal que o ser oferece à percepção humana. Não há uma “coisa em si” a ser apreendida para além da percepção, porque, precisamente, o que o ser oferece à nossa percepção é o seu “em si” e nada mais, ou, como diria Zubiri, aquilo que ele é “de suyo”, de seu, de próprio, de real.

 

Huxley, que nunca ouviu falar de Zubiri (as obras do filósofo só vieram a difundir-se no mundo a partir da década de 70, após a morte de romancista), chegou, pela experiência pessoal da luta pela visão, a conclusões similares. A “arte de ver” (The Art of Seeing, 1943) não consistia no esforço interrogativo que, segundo Kant, equiparava o buscador do conhecimento ao juiz de instrução que inquire ativamente a testemunha em vez de deixá-la falar o que quer. Bem ao contrário, consiste numa aceitação passiva e gentil daquilo que as coisas, “de suyo”, queiram nos mostrar. A redução da libido dominandi intelectual às suas justas proporções fazia do ato de ver uma devoção contemplativa ante a realidade do mundo.

 

A segunda descoberta filosófica de Huxley, no curso de seus exercícios ópticos, filia-o a uma tradição ainda mal conhecida no Ocidente de hoje, e praticamente desconhecida no mundo acadêmico do seu tempo. A natureza do mundo objetivo, nas suas experiências, revelava-se essencialmente como luz -- luz no sentido físico, sustentada, porém, desde o íntimo, pela luz espiritual. A ativação desta última, no sujeito cognoscente, despertava a sua contrapartida objetiva sob a forma da luz inteligível que se revelava nas coisas vistas, simultaneamente à sua revelação pela luz física. A meditação deste ponto remonta à “filosofia iluminativa” de Shihaboddin Sohrawardi (1155-91) filósofo persa cujas descobertas só encontraram, no Ocidente, um eco acidental e longínquo em observações casuais de Robert de Grosseteste (c. 1170-1253). Huxley soube algo de Sorawardi, anos depois, pois menciona-o de passagem em algum ensaio. Mas, na época em que fazia as experiências relatadas em The Art of Seeing, já estava mergulhado, sem saber, numa atmosfera inconfundivelmente sohrawardiana.

 

Esses pontos já bastam para mostrar a intensidade filosófica do mundo interior de Aldous Huxley, o que o coloca num patamar intelectual bem superior ao da média dos romancistas do seu tempo.

 

Mas a especulação vivenciada dos mistérios da percepção levou-o a algumas interessantes experiências no campo da técnica ficcional. Em “Contraponto” (1923), ele esboça a reconstituição da unidade de uma atmosfera emocional pela justaposição de detalhes aparentemente separados. Isso poderia fazer pensar, à primeira vista, na síntese kantiana. Mas, lida com mais atenção, cada cena do romance já traz em si, como em miniatura, o tônus emocional do conjunto. Não se trata, pois, da unificação intelectual de um significado a partir de detalhes insignificantes, mas sim de uma mesma realidade vista em dois planos: de perto e de longe. Mais que “dados” atomísticos kantiano, os episódios de “Contraponto” são mônadas de Leibniz, cada uma refletindo, desde o seu ângulo próprio, a forma do conjunto.

 

Algo dessa técnica repete-se nas primeiras páginas do “Admirável Mundo Novo”. Flashes da produção de bebês in vitro, do doutrinamento de crianças para a cidadania padronizada, das diversões programadas como parte da disciplina civil, vão recompondo, aos poucos, a imagem global de um mundo do qual a liberdade de escolha foi excluída e onde as criaturas repousam confortavelmente na submissão hipnótica à ordem estatal perfeita. A sociedade futura aí descrita, que o autor situa no século VII d. F. (“depois de Ford”, ou às vezes “depois de Freud”) é aparentemente uma utopia, no sentido definido por Goethe: “Uma série de idéias, pensamentos, sugestões e intenções, reunidos para formar uma imagem de realidade, embora no curso ordinário das coisas dificilmente venham a se encontrar juntos.” Um universo assim construído teria uma constituição nitidamente kantiana: síntese mental de dados que, na realidade, se encontram dispersos. Mas essa não é, definitivamente, a estrutura do romance de Huxley. Nenhum dos elementos da Nova Ordem Mundial que ele nos apresenta pode ser concebido separadamente. Não se pode controlar administrativamente as emoções humanas sem a ajuda química (as pastilhas de soma), nem habituar as multidões à satisfação bovina de uma auto-hipnose permanente sem controle laboratorial de suas predisposições genéticas; nem, muito menos, fazer tudo isto ao mesmo tempo na escala limitada de um Estado nacional, sem o controle simultâneo de todo o globo terrestre. Mundialismo, controle genético, adestramento comportamental e intoxicação coletiva não são dados soltos para a mente construir com eles uma utopia: são órgãos solidários e inseparáveis de um mesmo e único sistema. Onde quer que apareça um deles, os outros o seguirão, mais cedo ou mais tarde. A lógica deste romance imita e condensa a lógica da História.

 

Por isso mesmo o “Admirável Mundo Novo” é menos uma utopia, uma especulação sobre um futuro possível, do que a percepção imediata do nexo interna por trás de uma pluralidade de modas e escolas de pensamento que floresciam na época em que o romance foi escrito, e que constituem a matriz unificada, não somente do mundo possível no século VII d. F., mas do mundo em que vivemos hoje. Huxley, com efeito, nada inventou. Tudo o que fez foi perceber a unidade subjacente às idéias dominantes do seu tempo, que geraram nosso modo de existir atual. A atmosfera em que vivemos foi, de fato, determinada pelas concepções de Lenin e Ford, Margareth Mead e H. G. Wells, Malinowski e Pavlov. As referências, sutis ou abertas, a estes e a muitos outros “maîtres à penser” da década de 20 abundam nas páginas deste livro, que portanto pode ser lido menos como uma utopia no sentido goetheano do que como um diagnóstico da unidade de sentido por trás de tendências de pensamento que se ignoravam umas às outras no instante mesmo em que, às cegas, concorriam para erguer as paredes de um mesmo edifício: o edifício da Nova Ordem Mundial.

 

O Sr. Wells, um autor menor que acabou por ser quase esquecido, é mencionado de passagem neste livro como um dos principais construtores da Nova Ordem. Passados oitenta anos, poucos observadores da realidade de hoje se dão conta de quanto ele contribuiu para formá-la, coisa que no entanto já estava óbvia para Aldous Huxley em 1931. O Sr. Wells, no livro “A Revolução Invisível” (1928), foi o primeiro a apresentar o projeto integral de uma Nova Ordem, que parece ter inspirado de algum modo os Srs. Clinton e Blair. Que feito de tão magna importância fosse obra de um autor que representa mais do que ninguém a mediocridade satisfeita do progressismo moderno, é coisa que não deve nos estranhar, pois a Nova Ordem, com seus clones, seus tribunais mundiais e seu controle da internet, não é outra coisa senão a mediocridade materializada em escala global -- o mundo onde o Sr. Wells se sentiria tão à vontade quanto Bouvard e Pécuchet.

 

As contribuições menores não devem porém ser desprezadas. Nossas concepções atuais sobre o prazer sexual ilimitado como um direito a que o Estado deve assegurar o acesso igualitário das massas não teriam sido possíveis sem o relativismo antropológico de Margaret Mead. Se enquanto cientista ela foi tão precária quanto é minguado o talento literário do Sr. Wells, nada mais justo: somente a pseudociência e a pseudoliteratura podem gerar mundos. Sua função, como já dizia Karl Marx, não é a de compreender o real, mas a de mudá-lo. Mas as idéias não precisam ser inteiramente falsas para esse fim. Basta que sejam infladas para além de seus limites razoáveis. Pavlov, por exemplo, descreveu com acerto a psicologia dos cães. O homem não pode ser compreendido integralmente à luz da psicologia canina, mas pode ser integralmente manipulado desde a parte canina do seu ser, transformando-se em algo praticamente indiscernível de um cão, o que dará à psicologia de Pavlov, na prática, um alcance que ela jamais poderia ter em teoria. De modo análogo, todos podemos ser levados a comportar-nos como pacientes psicanalíticos, militantes proletários ou peças de uma linha de produção, dando uma espécie de “segunda realidade”, como diria Robert Musil, às ideologias de Freud, Marx e Henry Ford. Depois disso, contestar essas teorias se tornaria tão difícil quanto tentar provar o valor da vida a um suicida que, tendo saltado do décimo andar, já se encontrasse à altura do sexto ou quinto. A dificuldade que os personagens deste livro encontram para perceber a irrealidade do mundo social que as rodeia é dessa mesma índole: elas constroem essa irrealidade a cada instante, com suas próprias vidas, e se aprisionam nela no ato mesmo de tentar contestá-la em pensamento.

 

A unidade maciça do pesadelo descrito neste livro não é um produto da mente, construido com indícios esparsos, um vulgar “silogismo imaginativo” eisensteiniano em que, dadas duas imagens reais, o espectador contrói uma terceira, fictícia, e nela crê. É antes a visão real da unidade da atmosfera cultural dos anos vinte e trinta condensada em imagens e projetada -- erroneamente -- num século futuro. Erroneamente, digo eu, porque o próprio Aldous Huxley, em 1959, confessava seu erro de datas: “As profecias feitas em 1931 estão para realizar-se muito mais depressa do que eu calculava”, afirmou ele em Brave New World Revisited, uma atemorizante coletânea de ensaios sobre lavagem cerebral, persuasão química, hipnopédia, influência subliminar e outras técnicas de manipulação comportamental que, previstas para o século VII d. F., já estavam prontas para o uso na segunda metade do século XX. Passado mais meio século, porém, já transcendemos a época das descobertas técnicas e entramos, em cheio, na da sua aplicação rotineira em escala mundial. Uma boa descrição parcial desse estado de coisas encontra-se no livro de Pascal Bernardin, Machiavel Pedagoge ou le Ministère de la Réforme Psychologique (Paris, Éditions Notre-Dame des Grâces, 1998), que analisa as técnicas educacionais hoje padronizadas em todo o mundo sob os auspícios de governos e de prestigiosos organismos internacionais. As conclusões do seu exame são duas. Primeira, a educação das crianças no mundo de hoje despreza a sua formação intelectual e se dedica quase que inteiramente ao adestramento comportamental dos perfeitos cidadãozinhos da Nova Ordem Mundial. Segunda: as técnicas usadas para esse fim pouco têm a ver com o que que se denominava tradicionalmente “pedagogia”, mas se constituem essencialmente de manipulação pavloviana. Que isso ocorra simultaneamente a experimentos de clonagem humana, à formulação de uma ética padronizada para abolir todas as diferenças culturais e religiosas, à instauração de um poder médico global incumbido de receitar e vetar condutas a pretexto de higiene e saúde, à criação de tribunais mundiais para impor à toda a humanidade o direito penal de Wells, Bouvard e Pécuchet -- nada disso é coincidência, nada disso é síntese mental de dados esparsos. É a unidade de um sistema de erros, cujas sementes Aldous Huxley identificou em 1931 e cujo crescimento ultrapassou, em velocidade, os seus mais sombrios diagnósticos.

 

No entanto, o mundo em que vivemos ainda não se parece, no seu todo, com o Admirável Mundo Novo. A diferença principal é que neste os “selvagens”, isto é, as pessoas que rejeitavam a existência antisséptica na sociedade perfeita e continuavam presas de hábitos bárbaros como ler a Bíblia, rezar e educar seus próprios filhos em vez de entregá-los ao Estado, se encontravam isoladas geograficamente, vivendo em reservas a milhares de quilômetros dos centros civilizados. No mundo de hoje, elas vivem soltas nas grandes cidades, misturadas aos seres humanos normais que só acreditam nos noticiários da TV e que entregam não só seus filhos como também seus pais à guarda do Estado. Por isto a vida moderna não tem a uniformidade tediosa das cidades de Huxley.

 

Mas isso não quer dizer que, no domínio da estrutura social, ao contrário do que acontece no da tecnologia, o cumprimento da profecia esteja atrasado. Nas últimas quatro décadas, a elite bem-pensante inventou meios tão eficazes de isolar psicologicamente, culturalmente e socialmente os indesejáveis, que separá-los geograficamente tornou-se uma despesa desnecessária. A presença de um crente nas altas cátedras universitárias ou nos cargos de destaque do jornalismo, por exemplo, tornou-se tão inconcebível, que todos os selvagens que poderiam ambicionar esses postos recuam espontaneamente para os bas-fonds da vida social, deixando o palco inteiramente à disposição dos bons cidadãos. A secretária de Estado Madeleine Albright foi até explícita: qualquer americano que contribuísse regularmente para uma igreja e se preparasse ativamente para o Juízo Final se tornariam um virtual candidato a ter sua vida vasculhada pelo FBI. As reservas de “selvagens” não estão nos confins da Terra como no romance. Elas estão entre nós.

 

Nas suas últimas décadas de vida, Aldous Huxley adotou decididamente uma escala de valores “selvagem”. Mergulhou no estudo das literaturas sapienciais e místicas, adquirindo uma antevisão daquilo que Fritjof Shuonn viria a chamar “unidade transcendente das religiões”, tão diferente do ecumenismo burocrático de hoje quanto as visões de Sta. Teresa ou Jacob Boehme diferiam da leitura de uma circular da CNBB. Com isso, tornou-se estranho e incompreensível, simultaneamente, aos materialistas da linha Wells e aos paladinos de ortodoxias exclusivistas. Aventurou-se mesmo numa tentativa -- falhada -- de descobrir nas drogas alucinógenas a rota de fuga para fora da percepção padronizada. Mas a experiência fracassada não foi estéril. Se não abriu para quem quer que fosse “as portas da percepção”, despertou Aldous Huxley para a temível realidade da manipulação química do comportamento, que ele denuncia corajosamente em Brave New World Revisited, e para os aspectos falazes e ilusórios da democracia, que ele caricatura impiedosamente em seu último romance, A Ilha, espécie de contrapartida dialética do Admirável Mundo Novo.

 

Da observação microscópica do mecanismo da percepção até a intuição global dos rumos da história humana, o olhar de Huxley jamais perdeu de vista a unidade do real e, em conseqüência, o senso da integridade humana, que tantos romancistas, seus contemporâneos, cedendo à suprema tentação, não fizeram senão dispersar numa poeira de estilhaços.

 

Nenhum de seus livros dá conta integral da riqueza de sua experiência do mundo. Mas em nenhum deles está ausente a tensão entre o apelo unificante do alto e as brutais forças centrífugas que tentam dissolver a unidade da consciência para mais facilmente amoldá-la à mera uniformidade exterior de um mundo forjado. Voltar a si, reconquistar perenemente o senso da verdadeira unidade e, com isto, redescobrir a luz do espírito em seus reflexos no mundo exterior -- eis o sentido da vida e da literatura de Aldous Huxley. Poucos escritores, no século XX, souberam colocar a ocupação literária a serviço de finalidade tão alta e tão nobre. Por isto a obra de Aldous Huxley, malgrado seu múltiplos defeitos, sobreviverá. Ela tem o interesse permanente de tudo aquilo que se volta para “a única coisa necessária”.

 
26/03/2001
 
FILME: ADMIRÁVEL MUNDO NOVO (LEGENDADO)
 

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

A IDEOLOGIA DO SÉCULO XX

Autor: José Osvaldo de Meira Penna
Editora: Instituto Liberal. Reeditado, Nórdica IL
Assunto: Ensaio
Edição: 2ª
Ano: 1994
Páginas: 254

Sinopse: O livro apresenta ensaios sobre o Nacional-socialismo, o Marxismo, o Terceiro-mundismo e a Ideologia brasileira. A história do século XX é realmente a história do homem singular. É a história do conflito do homem individual, livre, em sua resistência ao avassalamento crescente pela sociedade de massas no Leviatã do Estado nacional soberano. É a história do protesto em que as mentes da população são atacadas por mitos e manipulações ideológicas em suas diversas modalidades, numa espécie de psicopatologia coletiva.
“A cada um cabe situar-se nesse entrevero fatal. Este livro representa minha própria colocação, a qual, espero, poderá interessar aos que comungam das mesmas preocupações e angústias” (Meira Penna).
Meira Penna conclui que o Estado que socializa a economia e os meios de comunicação é obsoleta, pois nem o socialismo, nem o nacionalismo, oferecem soluções para os problemas brasileiros de escala planetária. Ou a humanidade supera a idade do Estado sacralizado no socialismo, ou estará condenada pelos impasses que não podem ser abordados e vencidos ao nível de interesses nacionais conflitivos. A meta, por conseguinte, é transcender a ideologia da religião política, superar o nacionalismo e o socialismo numa sociedade aberta e ecumênica, orientada segundo critérios de razão prática ou ética pragmática - uma sociedade aberta para o mundo, mas introvertendo, na autonomia do homem moral responsável, os princípios da filosofia perene e de nossa ética ocidental cristã.

Sobre o autor:
José Osvaldo de Meira Penna. Diplomata de carreira, aposentado, antigo professor da Universidade de Brasília. Nasceu em 1917, ingressando no Itamaraty, por concurso, em 1938. Bacharel pela Universidade do Brasil, fez cursos na Universidade de Columbia, Nova Iorque, e na Escola Superior de Guerra (1965). Os primeiros anos de sua carreira foram vividos no Oriente, Clacutá, Shanghai, Ankara e Nandjing. Na China foi, da primeira vez, surpreendido pela guerra (1942) e, da segunda, assistiu ao colapso do regime nacionalista chinês. Serviu ainda na Costa Rica, no Canadá e na missão brasileira junto às Nações Unidas, de onde voltou ao Itamaraty para chefiar a Divisão Cultural (1956-1959), ao tempo da construção de Brasília, para cuja divulgação no exterior muito contribuiu. Como cônsul geral em Zurique, aprofundou seus conhecimentos de psicologia analítica, freqüentando durante três anos o Instituto C.G. Jung (1960-1963), onde também tem, regularmente, pronunciado conferências. Foi embaixador na Nigéria, secretário-geral adjunto do Ministério das Relações Exteriores para a Europa Oriental e Ásia, embaixador em Israel (1967-1970), assessor do ministro da Educação e Cultura, embaixador na Noruega, no Equador e na Polônia, onde terminou sua carreira (1981).

domingo, 15 de fevereiro de 2009

GUERRILHA DO ARAGUAIA Relato de um combatente

Autor: Licio Maciel
Assunto: História do Brasil - guerrilha
Editora: Corifeu
Edição: 1ª
Ano: 2008
Páginas: 192

Apresentação: Este livro diz respeito, principalmente, ao que o autor vivenciou no comando de um pequeno grupo de operações de informações e combate na luta no Araguaia, deixando um legado incontestável de combates leais e decisivos.
Na equipe que autor liderou cooperaram diretamente, por revezamento, cerca de cinqüenta militares, principalmente, soldados, cabos e sargentos dos Batalhões da Selva. Eles haverão de relatar, mais cedo ou mais tarde, os combates em que participaram. Alguns, em confiança, concordaram agora descrever detalhes de passagens que lhes ficaram na lembrança.
Experiências fortes não são apagadas facilmente da memória. O autor passou mais de trinta anos em silêncio, sem mencionar o assunto Araguaia. Todavia, em face de versões infundadas que foram veiculadas pela imprensa e por livros absolutamente não correspondem à verdade, o autor decidiu revelar num livro pungente toda a trama, as lutas do seu esquadrão e de como se portaram os militares brasileiros em face à ameaça dos guerrilheiros do Araguaia.
Leia e tire suas conclusões, pois esse é um assunto que merece toda a sua atenção em face do que se apresenta hoje, numa tentativa de revanchismo e de denegrir as forças armadas brasileiras.

Comentário: A questão que se apresenta no momento, não é tão somente a de denegrir as forças armadas, mas o projeto em andamento para a quarta tentativa de tomada do poder no Brasil para entregar o país ao comunismo internacional, tal qual foram as três tentativas anteriores, felizmente fracassadas graças ao mérito das nossas forças armadas que jamais traíram a pátria, tal como os psicopatas que estão no poder estão fazendo. Quem honra, honra.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

A VERDADE SUFOCADA: A história que a esquerda não quer que o Brasil conheça

Autor: Carlos Alberto Brilhante Ustra
Editora: Ser
Assunto: História do Brasil
Edição: 3ª
Ano: 2007
Páginas: 567

Sinopse: A obra permite ao leitor formar um verdadeiro juízo de valor sobre o que foi a revolução esquerdista no Brasil que culminou com a contra-revolução militar, bem como a realidade dos fatos daqueles anos conturbados e que hoje são bombardeados por versões enviesadas de uma esquerda mentirosa e revanchista.

Comentários:
A obra revela a face e a mente psicopata e assassina de terroristas da esquerda brasileira, que se autodenominavam de revolucionários, mas na verdadeira acepção da palavra, nunca passaram de excrementos fanatizados pela psicose marxista, que se lançaram numa aventura covarde e fratricida.
Os reais desígnios dessa matula era transformar o Brasil em satélite do comunismo internacional, ao qual rendiam culto divino, utilizando-se da falácia de que lutavam para promover a “liberdade” e a “democracia”.
Hoje, muitos deles campeiam nas mais altas esferas governamentais, no serviço público, nas universidades, redações de revistas e jornais, emissoras de rádio e televisão, nos meios artísticos e posam de moralistas, seres “divinos” que estão acima do bem e do mal. Agora, detentores do poder e da “verdade absoluta”, levam adiante o projeto gramsciano de transformar o Brasil num país comunista, sob a égide de um regime totalitário.
Este livro é para ser lido e assimilado por homens cristãos, de conduta moral ilibada, acima de qualquer suspeita. Trata-se de um antídoto contra a satanização da nação brasileira.

Anatoli Oliynik

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

A GRANDE MENTIRA

Autor: Gen Agnaldo Del Nero Augusto
Assunto: História do Brasil
Editora: Bibliex Cooperativa
Edição: 1ª
Ano: 2001

Sinopse: O livro descreve, de forma objetiva e completa, as tentativas de tomada do poder pelos comunistas. O autor assenta sua obra na sinceridade e na pesquisa, esclarecendo e desmistificando fatos e verdades do discurso das esquerdas brasileiras.
Soljenitsin, prisioneiro por 38 anos dos campos de trabalho soviéticos e autor do livro “Arquipélago Gulag”, assim se expressou: “O pior do Comunismo não é a opressão, é a mentira”.
Com a mentira e valendo-se de técnicas psicológicas de indução, os comunistas patrícios, com referência a sua atuação desde os primórdios até a guerrilha da década de 1970, montaram uma versão mentirosa e deturpada dos fatos.

Era preciso restabelecer a VERDADE, para esclarecer as jovens gerações. É a proposta deste livro, que narra de modo preciso e sem paixões, os acontecimentos como eles realmente ocorreram.
RESENHA DO LIVRO
Valter Martins de Toledo ( * )

Introdução

Diz um provérbio citado por Alexandre Soljenitsin no início do livro Arquipélago Gulag “Não se deve remexer no passado! Aquele que recorda o passado perde um olho”. Mas o provérbio tem um complemento: “Aquele que o esquece perde os dois”. Vamos remexer. Enquanto tivermos um olho seremos capazes de obter a conformidade entre o sujeito (inteligência) e o objeto (fatos ou situações). Só assim chegaremos à verdade, que consiste na perfeita conformidade da inteligência com o objeto.
Por outro lado, Jean Brunhes ensina que, por um estranho abuso de palavras, fala-se na veracidade de um fato. Um fato possui dimensões, cor, duração, mas não a verdade. Verdade (ou não) será a percepção que temos do fato, assim como mais ou menos justo pode ser o juízo que sobre ele formamos.
Estes ensinamentos podem servir como introdução às considerações que são tecidas a seguir, sobre os fatos em torno da ditadura militar que durou 20 anos.
O tema volta ao palco dos debates, e traz um fato recente: a destruição de arquivos do regime militar, descobertos na Base Aérea de Salvador.
As forças armadas brasileiras sempre combateram o totalitarismo, fosse de esquerda ou de direita. Participaram da II Guerra Mundial, onde tiveram papel de destaque, principalmente na tomada de Monte Castelo. Combateram o comunismo e o venceram em todas as ocasiões em que este tentou tomar o poder.
Porém, tais fatos são deturpados pela história, na medida em que esta é construída de forma unilateral pelos derrotados, com suas versões distorcidas dos fatos.
No Brasil, a ditadura militar foi o coroamento do enfrentamento, em três ocasiões, da tentativa de tomada do poder pelos comunistas. Todas foram impedidas pelas Forças Armadas, que livraram a população brasileira dos horrores do totalitarismo comunista, um dos mais bárbaros registrados pela História.

A primeira tentativa (Intentona Comunista – 1935)

Em março de 1919 foi realizado em Moscou o Congresso de Fundação da III Internacional, que ficaria conhecida como Internacional Comunista, ou IC. A finalidade era unificar e orientar o processo revolucionário mundial. Incentivava a criação de partidos comunistas em todos os países, partidos esses que ficariam subordinados ao PC russo. Lênin acreditava que a revolução russa era o primeiro passo para a adoção do internacionalismo proletário.
Em março de 1922 foi fundado o Partido Comunista – seção Brasileira da Internacional Comunista (PC-SBIC), registrado legalmente como entidade civil. Três meses depois, foi colocado na ilegalidade em decorrência do estado de sítio resultante da revolta tenentista.
Na década de 30 o Brasil vivia uma intensa agitação política. Julio Prestes, governador de São Paulo, era apoiado para a presidência da república. Getúlio Vargas, governador do Rio Grande do Sul, e Antonio Carlos de Andrade, de Minas Gerais, também aspiravam à sucessão presidencial. Os entendimentos políticos levaram à união em torno do nome de Vargas, e surgiu a Aliança Liberal.
Nessa época, Luiz Carlos Prestes, um respeitado líder tenentista, estava exilado na Argentina. Prestes não apoiou Getulio Vargas, porque não acreditava nas possibilidades da revolução apregoada pelos aliancistas, especialmente por Antonio Carlos, que afirmara: “Façamos a revolução, antes que o povo a faça”.
Em abril de 1935 Luiz Carlos Prestes voltou para o Brasil, acompanhado de Olga Benário, comunista alemã que tinha a missão de ser sua sombra, controlá-lo e protegê-lo.
Em 1934 o PC-SBIC mudou o nome para Partido Comunista do Brasil (Seção da IC), que passou a pregar a luta antifascista, organizada como uma “frente popular contra os integralistas”. Em 1935 foi fundada a Aliança Nacional Libertadora, que chegou a ter mais de cem mil militantes. Porém, o caráter marxista-leninista da Aliança logo a jogou na ilegalidade, decretada pelo governo Vargas. A Aliança passou a atuar na absoluta clandestinidade. Nesse mesmo ano aconteceu a Intentona Comunista, com combates confusos e mal liderados, em Natal, Recife e Rio de Janeiro. Houve, por parte dos insurretos, tiroteios desordenados, assassinatos covardes e saques a estabelecimentos comerciais e bancários.
A Intentona previa a insurreição nas capitais, porém, ficou restrita a essas três cidades, fracassando no mesmo dia.
Prestes estava em segurança no seu QG, porém, a derrota e a prisão de líderes comunistas desestruturaram o partido, ao qual foram imputados vários assassinatos, inclusive de correligionários acusados de traição.
O Brasil vencera a primeira tentativa de instauração do comunismo.

A segunda tentativa (revolução de 1964)

Em 1941 as tropas nazistas invadiram a Rússia, mudando radicalmente o mapa político do mundo. Stalin se apressou em ganhar o apoio das democracias ocidentais contra o nazismo. O PCB apoiou incondicionalmente o governo Vargas nessa luta. Ao final da II Guerra, o governo Vargas decretou a anistia e legalizou todos os partidos políticos. Prestes foi anistiado.
Em 1946 teve início a chamada Guerra Fria. A Rússia dominara mais de uma dezena de países do Leste Europeu e continuava apoiando os movimentos revolucionários em todo o mundo. O Brasil rompeu relações diplomáticas com a Rússia e cassou o registro do PCB, que caiu mais uma vez na ilegalidade. Porém, sua estrutura não foi tocada.
Em 1950, o PCB lançou o Manifesto de Agosto, que defendia a revolução como a única solução viável e progressista dos problemas brasileiros, defendendo a luta armada. Porém, apesar desse manifesto, a classe operária votou mais uma vez em Getúlio Vargas, que suicidou em 1954.
Nessa época, em muitas universidades ocidentais predominava uma visão social esquerdista, sendo que grande parte do Terceiro Mundo aclamava o modelo soviético como a estrada para a justiça social. Muitos intelectuais se declaravam marxistas. Essa situação, porém, era apenas uma conseqüência de anos de propaganda calcada na Grande Mentira.
Assim, a conjuntura era altamente favorável ao comunismo, o que provocou uma expansão dramática do comunismo. No final da década de 1950, o comunismo já aportara na América com a vitória da revolução cubana.
Entretanto, o mundo estava dividido pelo jogo de poder entre as duas superpotências, Estados Unidos e União Soviética, a chamada Guerra Fria. Nesse jogo, o Brasil despertou o interesse das grandes potências. Sendo um país de dimensões imensas, fronteiriço com quase todos os países da América Latina, seria também um elemento estratégico no cenário mundial, fazendo pender o fiel da balança estratégica para o lado desejado.
Em agosto de 1961, o Presidente Jânio Quadros renunciou. Deveria assumir João Goulart, contra o que se insurgiram os ministros militares, por considerarem que Jango apoiava o comunismo internacional. Assumiu Ranieri Mazilli, então presidente da Câmara dos Deputados. Leonel Brizola lançou um movimento legalista pela posse de Jango, seu cunhado. O impasse terminou no Congresso, que promoveu um plebiscito onde o povo votou o parlamentarismo, dando posse a João Goulart.
Segundo Gorender, “finalmente ocupava a presidência da República um político ao qual o PCB tinha acesso direto e que poderia considerar aliado”.
Outras organizações de esquerda começaram a surgir, divergindo da linha política do PCB, tais como os trotskistas (que chegaram a criar várias organizações, porém sem maior expressão) a POLOP (Política Operária, periódico que defendia o caráter socialista da revolução brasileira, ao contrário do PCB, que a caracterizava como nacional-democrática, e que, em seus primeiros anos, viveria a fase da luta ideológica contra o reformismo dominante), a AP (Ação Popular, uma criação da esquerda católica), a Frente de Libertação Nacional (lançada por Leonel Brizola e Mauro Borges, um mês após a posse de Goulart, enfatizava a ação exploradora do capital estrangeiro e a necessidade de nacionalização de empresas e da reforma agrária) o Master (movimento dos Agricultores sem Terra).
Enquanto isso, Goulart governava o país de uma forma pendular, ora pendia para o lado dos comunistas, ora para o lado dos conservadores. O país vivia agitações e greves nos grandes centros industriais. O sistema presidencialista foi restaurado no início de 1963. Porém as greves continuaram, sendo difícil calcular os prejuízos de toda ordem que ocasionaram ao país. Jango continuou governando de forma pendular. Em setembro de 1963, tudo indicava que o país caminhava para uma revolução de esquerda, principalmente com a rebelião dos sargentos de Brasília. Estes, liderados pelo sargento da Força Aérea Antonio Prestes de Paula, apossaram-se do Ministério da Marinha, da Base Aérea, da Área Alfa, do Aeroporto civil, da Estação rodoviária e da Rádio Nacional. Prenderam um ministro e o presidente da Câmara Federal. Porém, o movimento foi debelado e os seus líderes foram presos. Houve apenas um confronto do qual resultaram um marinheiro morto e dois feridos. Porém, um clima “pré-golpe de estado” foi se definindo, objetivando derrubar as instituições democráticas, supostamente lideradas pelo próprio João Goulart, que buscou o apoio das forças sindicais, agarrando-se às reformas de base como tábua de salvação, o que subverteria de vez todo o país.
No início de março de 1964, a conturbada situação nacional exigia medidas drásticas para solução da crise. Jango e o PCB mantinham entendimentos constantes. No dia 13, um comício realizado no Rio de Janeiro, ficou conhecido como o Comício das Reformas, realizado com recursos das empresas estatais e dos sindicatos. Mais de cem mil pessoas participaram, pedindo reformas, legalização do PCB e entrega de armas ao povo para a luta. No palanque, Jango, Arraes e Brizola. Parecia que Jango levava a melhor. Porém, na mesma noite, o Rio de Janeiro se iluminou de velas nas janelas, em demonstração do descontentamento de grande parte da população com os rumos que tomava a situação nacional, principalmente devido à impressionante demonstração de força, o tom radical dos discursos de Arraes e Brizola, a profusão de cartazes com a foice e o martelo.
No dia 19 aconteceu a primeira Marcha da Família com Deus pela Liberdade, que reuniu oitocentas mil pessoas, em oposição ao comício do dia 13.
Em 20 de março, AMFNB (Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais do Brasil) reuniu-se, declarando um motim. Seus dirigentes foram todos presos por ordem do Ministro da Marinha. No dia 26, os marinheiros amotinados fizeram exigências para o fim do movimento, entre as quais o seu reconhecimento legal. O ministro da marinha destacou um grupo de fuzileiros navais para prenderem os amotinados.
O CGT expediu um aviso de estado de alerta, denunciando o golpe da elite da marinha contra o povo, contra as reformas e contra o presidente da república. Brizola apoiou o movimento dos marinheiros e fuzileiros navais.
Na manhã do dia 27, a Marinha soube que havia outros movimentos rebeldes em alguns navios da esquadra. No dia 29, centenas de oficiais da Marinha reuniram-se, em flagrante protesto contra a quebra da disciplina e da hierarquia. Ninguém mais aceitava os desmandos do presidente que, à surdina, preparava um golpe esquerdista, com início previsto para primeiro de maio. De contatos entre o General Castello Branco, Chefe do Estado Maior do Exército, com outros oficiais generais, formou-se um grupo que passaria a ter importante papel no preparo da contra-revolução. As Forças Armadas estavam divididas, tanto que, no comício do dia 13, Jango foi prestigiado pela presença dos três ministros militares.
No dia 30 de março, finalmente desencadeou-se a contra-revolução, que inicialmente estava marcada para o dia 2 de abril. Tropas sediadas em Minas Gerais se dirigiram ao Rio de Janeiro, e se encontraram com as tropas do I Exército, que pretendiam barrar as forças atacantes. O confronto foi esgotado em diálogos de persuasão e em gestos de confraternização. No eixo Rio – São Paulo, confrontos semelhantes ocorreram. Na tarde de 1º de abril, tudo estava terminado. Ruíra o dispositivo militar do presidente. Ninguém se moveu nem esboçou resistência em defesa de Goulart. No dia 2 de abril, mais de um milhão de pessoas lotaram as ruas e praças do Rio de Janeiro, para comemorar a vitória da democracia sobre o comunismo. Foi a segunda vitória sobre a tentativa de tomada de poder pelos comunistas.

A terceira tentativa (período de 1968 a 1973)

A primeira preocupação do comando da contra-revolução foi como conciliar a manutenção das garantias democráticas com as medidas de prevenção contra os abusos. Segundo o Marechal Juarez Távora, “o caminho mais indicado para isso era a eleição imediata de um dos chefes militares da revolução para a presidência da república, assegurando-se, desde logo, com as restrições necessárias, o funcionamento do mecanismo de equilíbrio entre a liberdade e a ordem”. O General Costa e Silva não queria ser eleito, mas julgava indispensável que, antes de se eleger um novo presidente, era indispensável “limpar” o país. Com esta finalidade, no dia 9 de abril, foi editado e divulgado o primeiro ato revolucionário – o Ato Institucional, que veio acompanhado de uma lista de políticos cassados, incluindo quarenta parlamentares. O AI outorgava à revolução os poderes necessários para a rápida transformação do país, preservando os poderes e a própria Constituição. Autorizava a suspensão de direitos políticos pelo prazo de dez anos e a cassação de mandatos legislativos, excluída a apreciação judicial. Nisso tudo, a direita civil armada foi pega de surpresa pelo golpe militar e inteiramente desmantelada pelo novo governo.
Para a sucessão presidencial, o nome escolhido foi o do Gen. Castello Branco (vice deputado José Maria Alkmin. Fora escolhido um chefe militar a fim de garantir a unidade das forças armadas. Castello Branco assumiu prometendo que a elevação moral, educacional, material e política seria o centro das preocupações do Governo.
Porém, a posse da nova Presidência não trouxe consigo a unanimidade entre os participantes. O AI, por exemplo, não agradou os militares mais jovens, bem como alguns grupos revolucionários que desejavam uma ditadura imposta, sem eleição, com fechamento do Congresso e do STF, e dissolução dos partidos políticos. Essa ala ficou conhecida como linha dura, ou “fervorosos”. A outra ficou conhecida como linha moderada ou “moderados”.
O governo revolucionário herdara graves problemas econômicos e o governo teria que enfrentar a dura realidade de plantar muito e colher pouco. Algumas medidas descontentaram a população e foram usadas pelos agitadores para convencer os trabalhadores da insensibilidade do governo. Isto contribuiu para que os trabalhadores permanecessem afastados da revolução.
Na área estudantil a propaganda subversiva se disseminava, principalmente nas universidades. Em novembro de 1964 foi editada a Lei Suplici, que regulamentava a vida dos estudantes, proibia atividades político-partidárias, regulamentava a escolha dos representantes. Núcleos esquerdistas taxaram a nova lei de tipicamente fascista.
Porém, importantes medidas foram tomadas para o aperfeiçoamento do ensino. Foi feito o primeiro censo escolar, revelando que o país tinha trinta milhões de analfabetos. Criou-se o salário educação.
Em 1965 terminou a vigência do Ato Institucional. Esse ano foi marcado por sucessivas crises internas na área revolucionária. Houve eleições diretas para governador, o que não agradou os defensores da ditadura. No dia 27 de outubro o governo editou o AI-2, destinado a reunificar os grupos revolucionários em torno do poder incontestável da revolução. O AI-2 revigorava grande parte dos poderes que haviam expirado com o AI-1 e permitiu a posse pacífica dos governadores eleitos. Foram extintos os partidos políticos e instalado o regime bi-partidário: a Aliança Renovadora Nacional (ARENA), do governo, e o Movimento Democrático Brasileiro (MDB), da oposição.
Em 31 de março de 1966, quando se comemorava o aniversário da revolução, teve início uma série de atentados terroristas. Em Recife, houve explosões nos Correios e Telégrafos e no Comando do IV Exército; uma terceira explosão falhou, na Câmara Municipal. Em 20 de maio foram lançados dois coquetéis molotov e um petardo de dinamite contra os portões da Assembléia Legislativa.
Em 25 de julho Recife foi novamente sacudida por explosões, uma na sede da União dos Estudantes de Pernambuco, outra nos escritórios do Serviço de Informações dos Estados Unidos. A terceira bomba é considerada o marco inicial da luta terrorista no Brasil. Explodiu no Aeroporto Internacional de Guararapes, onde era esperado o Marechal Costa e Silva, então candidato à presidência da república, que, felizmente, não pôde viajar de avião. Na explosão morreram 15 pessoas.
Em agosto outra bomba explodiu no Cine Itajubá, em Santos. Em setembro, na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, em São Paulo.
Porém, o governo continuava trabalhando. Várias reformas foram implementadas: a Lei de Imprensa foi aprovada pelo Congresso, foi criado o Instituto Brasileiro de Reforma Agrária, a reforma administrativa foi consubstanciada no Decreto-Lei 200, de 25.01.1966, implantado o FGTS, o Instituto Nacional de Previdência Social, a Embratel, o FUNRURAL e o PRORURAL.
Movimentos de resistência armada foram organizados, inclusive com participantes treinados em Cuba, na Rússia, no Leste Europeu e até na China, países estes que, inclusive, financiavam a guerrilha no Brasil. Cerca de 20 organizações subversivas atuavam no país.
Em 15 de março de 1966 foi promulgada a nova Constituição, com a posse do Marechal Costa e Silva. Em janeiro de 1967, nova Constituição. A eleição fora pensada para ser direta e democrática, porém isto não foi possível devido ao início dos atentados terroristas. Das grandes manifestações de 1968, muitos jovens saíram para integrar organizações guerrilheiras urbanas, como conseqüência do trabalho político dentro do movimento estudantil. O celeiro da luta armada era a UnB (Universidade de Brasília). O objetivo era instalar no país um regime totalitário, a exemplo dos vigentes na Rússia, na China e em Cuba.
As agitações estudantis alastravam-se praticamente por todo o mundo. Amsterdã, Berlim Ocidental, Paris, Roma, Tóquio, Montevidéu, México e outras grandes cidades, foram palco de confrontos com a polícia, com derramamento de sangue e mortes.
Nesse clima, em 13 de dezembro de 1968 foi editado o AI-5, que gerou um estado de direito autoritário, uma “revolução dentro da revolução”. O AI-5 não tinha prazo de vigência. Por ele o Congresso Nacional foi colocado em recesso, assim como seis Assembléias Legislativas Estaduais e dezenas de Câmaras de Vereadores em todo país; foram cassados mais de sessenta e nove parlamentares, assim como o ex-Governador Carlos Lacerda, suspenso o direito de hábeas corpus e restringida a liberdade de imprensa, para conter a propaganda subversiva. É importante enfatizar que a guerrilha irregular foi causa, e não efeito, do AI-5.
Em 1973, o Brasil vivia a euforia do “milagre brasileiro”. A economia crescia a níveis jamais alcançados. Porém, assaltos, assassinatos, atentados, seqüestros, atividades terroristas, de guerrilha, continuavam freqüentes. Os grupos responsáveis por essas atividades foram sendo gradativamente desarticulados, até que, em meados de 1974, concluiu-se que as forças subversivas já não tinham condições de atuar coordenadamente. Foi a terceira vitória contra o comunismo no Brasil.
O governo militar prosseguiu no Brasil até 1985, quando ocorreu a eleição direta para presidente da república.

Conclusão

A grande mentira refere-se ao comunismo que, sob uma capa de “proteção aos direitos humanos”, comparando-se ao Cristo que “passou pela Terra fazendo o bem, mas foi perseguido, torturado e morto”, deseja, na verdade, instaurar um regime totalitário.
No Brasil, com a anistia, os meios de comunicação foram inundados por matérias favoráveis aos ex-terroristas, reforçando a grande mentira. Cria-se, assim, uma situação invertida, como propõe Revel, em que aqueles que querem destruir a democracia parecem lutar por reivindicações legítimas, enquanto que aqueles que defendem a democracia são apresentados como artífices de uma repressão reacionária.
Os fatos devem ser analisados sem adjetivações, num trabalho sério e sem paixão, para que se possa fazer a reconstituição histórica de um período marcado por barbáries. É importante considerar que, nos dias atuais, a população é alvo da propaganda disseminada pelos vencidos (um grande contra-senso), que escondem seus verdadeiros atos e intenções. Afinal, sabe-se que uma “grande mentira”, repetida muitas e muitas vezes, ganha uma aparência de “verdade” que acaba sendo aceita.
Aos brasileiros que não viveram os períodos citados e recebem informações impregnadas por inverdades, distorcidas por ideologia intolerante, é importante que se ofereça a oportunidade de verem o outro lado dos fatos, de compararem as suas interpretações, de refletirem com espírito crítico e de encontrarem suas próprias verdades. Enfim, de conhecerem a ameaça que aqueles fatos representaram à liberdade e à democracia no Brasil.
Afinal, como bem assinala o ex-ministro Jarbas Passarinho, a história, é “O facho que ilumina o passado para precatar-nos de repetir os erros praticados.”

( * ) Valter Martins de Toledo é magistrado aposentado e membro da Academia de Cultura de Curitiba.