Título Original: V for Vendetta
Gênero: Aventura
Atores: Natalie Portman, Hugo Weaving, Ben Miles, John Hurt, Natasha Wightman, Roger Allam, Rupert Graves, Sinéad Cusack, Stephen Fry, Stephen Rea, Tim Pigott-Smith.
Gênero: Aventura
Atores: Natalie Portman, Hugo Weaving, Ben Miles, John Hurt, Natasha Wightman, Roger Allam, Rupert Graves, Sinéad Cusack, Stephen Fry, Stephen Rea, Tim Pigott-Smith.
Diretor: James McTeigue
País: EUA
Ano: 2006
Duração: 132 min.
País: EUA
Ano: 2006
Duração: 132 min.
Sinopse: O filme mostra um futuro não muito distante no qual a Grã-Bretanha é dominada por um regime totalitário que retirou às pessoas todos os seus direitos. Os cidadãos vivem no medo constante de um governo tipo comunista de Lênin e Stalin e nazista de Hitler, somados. Apresenta-se V, um paladino mascarado que pretende sublevar as massas da sua apatia submissa e destruir o símbolo do absolutismo – as casas do parlamento.
Na paisagem futurista de uma Inglaterra totalitária, V de Vingança conta a história de uma pacata jovem chamada Evey que é resgatada de uma situação de morte por um homem mascarado, conhecido apenas como "V". Incomparavelmente carismático e extremamente habilidoso na arte do combate e destruição, V inicia uma revolução quando convoca seus compatriotas a erguerem-se contra a tirania e opressão. Enquanto Evey descobre a verdade sobre o misterioso passado de V, ela também descobre a verdade sobre si mesma - e emerge como uma improvável aliada na preparação do plano de V para trazer liberdade e justiça de volta à sociedade repleta de crueldade e corrupção.
Resumo da narrativa e comentários: Depois de uma guerra com os EUA, o poder foi tomado por um líder, denominado o “Chanceler”, que é uma mistura de Hitler, Stalin e tem a cara de Lênin. “Chanceler” é o protótipo dos tiranos que só aparece em imagens televisas, exceto quando da sua execução, no final. Tudo que escapa à homogeneização é perseguido e destruído. O medo é a base real de poder do governo. O clima lembra o 1984, de George Orwell, com o Grande Irmão a espiar a vida de todos pelos olhos eletrônicos. É seguramente o filme político mais expressivo.
Os diálogos são sheakespearianos. No filme sublinha-se que coincidências não são meras coincidências. O próprio filme, se tomarmos o que se passa na América Latina, e no Brasil, não poderia ter vindo em melhor hora para alertar-nos a todos dos perigos da tirania a avizinhar-se, que provoca deliberadamente o caos para justificar-se e exercer seu poder maldito. A película como que descreve a nossa realidade.
Mas da mais negra tiraria e da mais tenebrosa desesperança brota o indivíduo que não teme a morte, que é batizado pelo fogo – na personagem masculina – e pela água, na sua versão feminina. Aí vencem o medo dentro de si e tornam-se os campeões na luta contra os tiranos, e vencem. Sabem, sabem que sabem e sabem de si. Tornam-se super-homens, além das massas, além do homem-médio. O sofrimento extremo deu-lhes a têmpera dos heróis.
“Os governos é que deveriam temer o povo, não o povo o governo”, uma frase lapidar. O homem da máscara é na verdade o indivíduo diferenciado que há em cada ser humano. Quando ele aparece o poder estatal se apequena, é destruído. A cena em que as Forças Armadas não têm coragem para disparar contra seu próprio povo, em movimento pacífico, é impressionante. O ator que faz o papel do general mostra a ambivalência do comandante que não pode dar a ordem mais nefanda, a de aniquilar os seus compatriotas.
A destruição do prédio do parlamento é um símbolo que mostra que a democracia, quando aparelhada para a tirania, não está mais representada no Poder Legislativo. Torna-se ele outro símbolo, o da opressão, e precisa ser destruído de forma impiedosa. Uma leitura rasa dessa seqüência poderia dizer que os autores do filme não gostam da democracia. É exatamente o contrário. A democracia só está no parlamento quando ele é legítimo e se subordina aos valores próprios da sociedade aberta.
O filme é uma obra de arte notável também pela sua trilha musical. A Abertura do 1812, de Tchaikovsky, que é tocada em dois momentos, torna sublimes e espetaculares as cenas de destruição que se desenrolam. O encontro do mascarado com o chefe da polícia secreta é marcado pelo toque da Quinta Sinfonia de Beethoven. Momento mágico, uma citação de Kubrick, que ornou o seu 2001 com outra notável peça musical, o Danúbio Azul.
A personagem mascarada sobrevive no submundo lotado de livros e obras de arte antigas, uma síntese dos tesouros culturais do Ocidente. Consciência é preservação da tradição. Ele luta com uma armadura. Veste a persona dos europeus nobres dos tempos antigos, que eram nobres precisamente porque conquistavam a distinção no campo de batalha, em defesa de seus compatriotas mais fracos e mais pobres. Quem “sabe” é aquele que carrega o peso de todo nosso tesouro cultural. É isso que pode tornar um homem-massa um indivíduo diferenciado. Pelo conhecimento. Conhecer-se a si mesmo impõe conhecer os tesouros da tradição.
O caráter duplo das personagens principais: “V” e “Evey” formam uma totalidade. A personagem feminina entra na cena inaugural fazendo a narrativa de seu encontro com o seu duplo. A mulher representa a Verdade, enquanto que o homem o guerreiro que a defende.
A narrativa mostra ambos se preparando para sair à rua, para viver a sua saga, ele se armando e ela se vestindo, como é próprio do ser feminino, sua arma. O pano de fundo é o locutor governamental fazendo sua exaltação antiamericana e sua profissão de falsa fé e de falso moralismo. Sua propaganda política mentirosa. Na rua Evey é surpreendida pelo toque de recolher “para a proteção do povo”, como se a morte da liberdade protegesse alguém de qualquer coisa. Flagrada pelos esbirros da ditadura Evey sofre a ameaça de estupro, abortada pelo surgimento providencial do guerreiro “V”. Essa imagem não poderia ser mais delineadora do que se passa nos regimes totalitários, onde a liberdade é estuprada rotineiramente.
Uma das falas capitais da película é quando “V” se pergunta quem são os culpados e manda que todos se olhem no espelho. A culpa é de todos e de cada um. Nessa cena pode-se imaginar o que acontece no Brasil. Qualquer que seja o desfecho do processo que estamos a viver não há inocentes. Todos e cada um de nós temos a nossa parte de responsabilidade por colocar no poder a quadrilha criminosa de que nos falou o procurador-geral, em sua denúncia. Não há inocentes.
“Uma Idéia não pode ser assassinada”, a idéia de liberdade. É uma frase imortal. Notável como o guerreiro vingador se vale exclusivamente de armas brancas, de punhais vingadores. “Há uma violência que trabalha a favor do Bem” e é aquela que vinga os sacrificados pelos totalitários. Na verdade pode-se falar de uma violência defensiva do Bem, que pode ser preventiva, como foi por aqui em 1964, e pode ser vingadora como vimos na queda dos ditadores da Albânia e da Romênia.
“V” vai matando cada um de seus carrascos, que se revelam os líderes do partido totalitário que tomou o poder. Um deles é um padre pedófilo, que na verdade não é padre coisa nenhuma, é um militante infiltrado na Igreja que vira bispo porque é dirigente partidário e malfeitor enriquecido no poder. Outro, a cientista imoral que não hesitou em fazer de seus compatriotas cobaias humanas, a fim de obter seus objetivos torpes: semear o mal para vender o bem, a malvadez satânica personificada em um rosto sereno.
Claro, o sistema de poder totalitário exige uma polícia política ativa. Quem cai nas suas garras não escapa. A fala do ditador mandando seu Beria prender o que ele chamou de terrorista é reveladora: “Pegue-o o mostre o que é o verdadeiro terror”.
A cena final é emocionante. A multidão como que desfila diante das forças militares, em inversão do que se poderia esperar habitualmente. As Forças Armadas não podem agir contra seu próprio povo. Correu-me uma lágrima no canto do olho, porque não dizer? É um fecho surpreendente para uma história surpreendente.
Há que se destacar, também, o substrato principal, que permeia todo o filme: a história do Conde de Monte Cristo, homem que sofreu a injustiça mais atroz, tendo sido atirado impiedosamente às masmorras. Mas ele é forte e vence, não sem antes mergulhar no mais fundo de sua alma e por isso é recompensado pelo tesouro = riqueza interior buscada quase ao custo da própria vida. Torna-se um indivíduo no exato sentido da expressão. Tiraram-lhe tudo: esposa, filho, honra, bens e até o nome. Ele ficou só com a sua solidão e a sua sede de justiça: “Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão saciados”.
A história de Alexandre Dumas é singular porque os que praticaram a maldade estão além dos poderes desse mundo, pois são eles mesmos os poderes: têm as alavancas do Estado à disposição e também o poder do dinheiro. Estão a salvo da Justiça, exceto a divina, cujo instrumento é a própria vítima vingadora. A violência usada para o Bem. “Toda ação gera uma reação igual e contrária”, frase que no contexto é lapidar. Aquele que sofre no limite do sofrimento, a quem só restou o fio de vida, esse perde o medo de qualquer coisa, pois nada mais tem a perder. Foi batizado pelo fogo e pela água. Torna-se o vingador, semelhante a um Deus encarnado: “Minha será a vingança, eu é que retribuirei”.
Só há felicidade no final, quando cada um pode escolher a sua árvore, o seu justo lugar no mundo. Num dos trechos vemos uma saborosa citação de Macbeth, de William Shakespeare, peça que se singulariza pelo fato de a protagonista ser do sexo feminino, a que pensa, planeja, mas não tem como agir, age através do marido, seu instrumento de ação. Assim é Evey, o duplo feminino de “V”. Vejamos o trecho citado:
"Estás temeroso de ser o mesmo em teu próprio ato e valor de que em teu desejo? Não terás o que mais estimas, o ornamento da vida, e viverás um covarde em tua própria estima, deixando ´Eu não posso´ ultrapassar ´eu farei´, como o pobre gato no adágio?". ... "És um homem".
Uma mulher falando assim ao seu homem impele-o para os embates gloriosos e desconfio que a maioria das mulheres fazem isso todos os dias. Não basta ser um mesquinho homem, é preciso se superar, alcançar o cume dos heróis, ainda que nas coisas do cotidiano. O cartão de visitas da mulher é a sua beleza, a do homem a virtude da coragem. Esse é “V”, a mão que empunha a faca vingadora e justiceira.
O heroísmo final, momento em que “V” se dá em sacrifício para completar o exercício da justiça contra os poderosos, é sublime. Creedy, o Beria do filme, a besta assassina, atira e fura mortalmente a sua armadura. “V”, todavia, sobrevive o bastante para realizar a sua vendetta. E diz uma frase lapidar: “Por baixo da armadura não está apenas carne, mas Esperança” (cito de memória). Haverá uma maneira mais bela e poética, sintética, de alguém se dizer cristão? Como no Matrix, os Irmãos Wachowski deixam claro sua inspiração cristã, pois não se pode falar da civilização ocidental, como o faz o filme, sem falar do Cristianismo de forma afirmativa e maiúscula.
Eis o filme. Vê-lo é um deleite para o espírito, um instrumento de inspiração, um consolo para quem, como nós brasileiros, estamos a flertar sem pudor com o totalitarismo.
Em resumo, se você ainda não viu o filme, veja. É de longe o melhor filme dos últimos tempos. (Nivaldo Cordeiro)
2 comentários:
O filme V for Vendetta é excelente, realmente. Mas há outro filme também excelente sobre política: "Die Welle" (A Onda). Não deixe de ver!!
Obrigado pela dica, James.
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